Por Cristiane Martins
É muito comum os adultos se maravilharem com a ação de bebês e crianças em objetos como dispositivo móvel ou os brinquedos prontos com seus botões. Quando nós adultos pensamos na ação da criança julgamos que apertar um botão é o ápice do desenvolvimento e inteligência, ficamos satisfeitos com o apertar o botão. Damos para essa ação um grande valor. Essa é a perspectiva do adulto a genialidade de apertar um botão. Mas será essa uma ação de grande valor? Essa é a grande habilidade motora e cognitiva de uma bebê?
Quando o bebê aperta um botão há um grupo pequeno de ação muscular e o bebê espera a resposta do brinquedo ou do aplicativo no dispositivo móvel. O que acontece quando o bebê pega um objeto qualquer? Algo que estava próximo dele e o chamou atenção? O bebê pode estar deitado com as costas no chão ou sentado e quando localiza algum objeto (não necessariamente um brinquedo) apenas o fato de localizar já promove ações do pensar e ações do corpo no alcance do que lhe é interessante. Se esse objeto for de um peso e tamanho que a mão do bebê consegue segurar sem derrubar e manipular esse objeto muitas ações seguirão desse alcance: ele manipula o objeto de muitas maneiras, vira de todos os lados possíveis, aproxima e afasta, aproxima dos olhos para ver detalhes ou algo curioso, usa as duas mão ou pode até trocar o objeto de mãos, cheira, chacoalha na busca de sons, bate no chão ou em outro objeto mais uma vez na busca do som e muitas outras produções que podem surgir da interação ativa do bebê com um objeto qualquer. E esse objeto pode ser apenas uma colher, ou um pano, ou um pote de guardar alimentos, uma simples bola, simples brinquedo de encaixe, argolas etc.
E quais dessas atividades são mais valorizadas pelos adultos? Será que ainda acredita que apertar um botão seja uma manifestação da genialidade de um bebê? Será que um botão possibilita o mesmo número de ações motoras e cognitivas que a vasta exploração de um objeto qualquer?
Nós adulto criamos expectativas com o brincar do bebê que nos satisfaça como adultos, esquecemos que a criança é autora do próprio desenvolvimento quando há um ambiente propício para esse desenvolver, para as aventuras da exploração do entorno. Os objetos estruturados que sempre dão um retorno precisam de poucas ações e criança fica hipnotizada e apertando botões, assim como nós adultos hipnotizados nos nossos celulares e retirados do mundo pelos muitos “botões” que cabem na vasta internet. Transferimos para os bebês e crianças os valores que damos para as nossas atividades como adultos e tudo que gostamos, esquecemos que eles vivem numa outra fase e que a exploração do seu entorno, do mundo real é fundamental para o seu desenvolvimento global, a sua formação humana.
O bebê com deficiência visual também precisa explorar seu entorno, construindo através das atividades a sua autonomia. Esse bebê e essa criança também precisam conhecer o mundo. Esse é o desafio da equipe de terapeutas que acompanha esse bebê ou criança!
“...ser inteligente é estar em contato não somente com as ideias, mas estar em contato com o real.”
Jean-Yves Leloup – O corpo e seus símbolos
A equipe SENSO tem como objetivo guiar os pais e cuidadores de bebês e crianças com deficiência visual na criação de um ambiente que possibilite o uso da visão e dos outros sentidos para o contato com o real e uma interação com seu entorno que resulte num bom desenvolvimento global.
Cristiane Martins
Fisioterapeuta
Doutora em Ciências pelo programa de Neurociência e Comportamento da Universidade de São Paulo (IP-USP)
Especialista em Visão Subnormal pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP)